“Antes de partir”, “Canta Camarada”, "Momentos primeiros da construção" e "Os novos heróis", de José Carlos Schwarz

Este blogue pretende ser um lugar de divulgação da poesia guineense em português.

José Carlos Schwarz foi um poeta, músico e compositor, pioneiro da música moderna guineense, considerado como um dos mais importantes e notáveis músicos da Guiné-Bissau. Como referido por Fernando Casimiro (Didinho), constitui um exemplo de cidadania e uma referência do orgulho nacional.
Embora cantasse geralmente em crioulo, o que, na época, constituía por si só um manifesto de oposição ao regime colonial, também escreveu em português e francês. São da sua autoria os poemas em português que de seguida apresentamos.

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Antes de Partir

Antes de partir
Encherei os meus olhos, a minha memória
Do verde (verde, verde!) do meu País
Para que quando tomado pela saudade
Verde seja a esperança
Do regresso breve

Antes de partir
Encherei os meus ouvidos, a minha memória
Do palpitar que esmorece, enquanto a noite
Cresce sobre a cidade e no campo
Feito o silêncio dos homens e dos rádis...

José Carlos Schwartz, Antologia Poética da Guiné-Bissau


Canta camarada

Canta camarada
Deixa que o teu sonho verdade
Flua límpido nos anseios da tua voz quente
Pois este é o teu dever, o teu direito.
Canta camarada
Que a recordação da tua dor
Seja como a terra revolvida
Em cada época, para a sementeira.

Canta camarada
Apenas alguns nomes, para que seja exaltado o anónimo
Apenas os mortos, porque os vivos
Ainda podem desmerecer da nossa gratidão.
Canta camarada
Pois é a única benesse
Que te reservaste na oferta da tua juventude
Em Holocausto no altar da revolução.
José Carlos Schwartz, Antologia Poética da Guiné-Bissau

Momentos primeiros da construção

Nestes momentos primeiros da construção 
Após o desbravar das matas dos horizontes 
Não perguntes quem são os poetas, 
vem comigo e repara bem

Nestes tempos pioneiros da produção
Os recém-chegados e os veteranos sejam muitos
A fazer com que os radis naveguem
Fecundem a terra
E que as ferramentas torneiem e afinem
A engrenagem do processo

Sob estes ventos soalheiros da revolução
Que as quedas não sejam definitivas
E que os desfalecimentos sejam vencidos
Pela certeza da vitória que amanhecerá
Nas frescuras das madrugadas.

José Carlos, Momentos Primeiros da Construção
In Aldónio Gomes & Fernanda Cavacas, A literatura na Guiné-Bissau. Lisboa, Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1997

Os novos heróis

Digo-te que os novos heróis chegarão
Marchando ao compasso do nosso hino
Em que se entoam as esperanças,
Daqueles que com o seu sangue generoso regaram
A Pátria que hoje pisam os seus continuadores

Chegarão vindos dos campos, das bolanhas, das minas
A terra será livre na sua entrega amorosa e fecunda
Sem temer a violação de bombas criminosas,
A conspurcação de botas mercenárias.
Chegarão, a paz temperando-se no sal do seu suor

Dentre os tempos novamente pioneiros
- Pois que serão as metas atingidas
Senão novos pontos de partida, novos desafios? -
Dentre ventos soalheiros a aumentar a produção,
Virão verticais e seguros das suas raízes

Das fábricas modelando novos horizontes às tabancas,
Para que as culturas ancestrais transbordando as nascentes
Galguem novos espaços, ganhem novas alturas.
Estes homens serão colheita e sementeira, gérmen e fruto
Da sociedade nova porque se forjam e morrem os heróis!

José Carlos, Momentos Primeiros da Construção
In Aldónio Gomes & Fernanda Cavacas, A literatura na Guiné-Bissau. Lisboa, Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1997

Deixamos, como curiosidade, o documentário sobre José Carlos Schwartz, do realizador Adulai Djamanca.
"José Carlos Schwartz, a Voz do Povo" - Parte 1:



"José Carlos Schwartz, a Voz do Povo" - Parte 2:


Nota biográfica:
Nasceu em Bissau a 6 de dezembro de 1949. Estudou em Bissau e Dacar. É considerado o pioneiro da música moderna guineense. Preso político, foi deportado para a Ilha das Galinhas. Após a independência foi diretor do Departamento de Arte e Cultura do Comissariado da Juventude e Desportos e encarregado de negócios da Guiné-Bissau em Cuba. Músico, compositor e intérprete, participou nas antologias de poesia guineense Mantenhas para quem luta e Momentos primeiros de construção. Morreu a 27 de Maio de 1977 num acidente de aviação em Cuba.

Fontes:


http://djidiu.blogspot.com/2012/12/jose-carlos-schwarz-sempre.html

http://guineletras.blogspot.com/2011/04/jose-carlos-schwarz.html
http://www.didinho.org/Arquivo/MEMORAVELJOSECARLOSSCHWARZ.htm
http://www.triplov.com/guinea_bissau/jose_carlos_schwarz/poemas/index.htm